quinta-feira, 2 de setembro de 2010

IPTU: Imunidade Tributária Recíproca e Cessão de Uso de Bem Público

O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se discute a possibilidade de cedente de imóvel público objeto de contrato de cessão de uso para exploração de atividade econômica estar sujeito, ou não, à tributação pelo imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU. Trata-se, na espécie, de recurso extraordinário interposto pelo Município do Rio de Janeiro contra acórdão do tribunal de justiça local que entendera, consoante o disposto no art. 150, VI, a, da CF ("Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: VI - instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;"), ser indevida a cobrança da aludida exação relativamente à empresa detentora da concessão de uso de imóvel situado em aeroporto de propriedade da União. Alega a recorrente violação ao art. 150, VI, a, e § 3º, da CF ("§ 3º - As vedações do inciso VI, 'a', e do parágrafo anterior não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel."), ao argumento de que a imunidade concedida aos entes federados não poderia beneficiar a exploração privada de atividades econômicas, pois tal hipótese seria expressamente excepcionada do campo da imunidade tributária recíproca. O Min. Joaquim Barbosa, relator, proveu o recurso. Inicialmente, rejeitou a preliminar de não conhecimento suscitada da tribuna, no sentido da incidência do Enunciado 283 da Súmula do STF ("É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles."), uma vez que o acórdão recorrido teria por base legislação infraconstitucional e o ora recorrente não interpusera recurso especial. Asseverou que o mencionado acórdão adotara como fundamento tanto a aplicabilidade da imunidade tributária à propriedade imóvel em questão como a impossibilidade de a recorrida ser tida como sujeito passivo.

Em seguida, o relator aduziu que o reconhecimento da imunidade tributária recíproca dependeria de aprovação nos estágios aludidos no julgamento do RE 253472/SP, acima relatado. Tendo em conta que a atividade exercida pela recorrida seria alheia à administração aeroportuária — já que exploraria "ramo do comércio de importação e exportação de automóveis, caminhões, motores e quaisquer espécies de veículos automotores, inclusive peças, acessórios, oficina mecânica, reparos, pintura de quaisquer veículos e outras atividades correlatas ao ramo automobilístico" —, entendeu que a pretensão de imunidade falharia nos estágios referidos. Assim, a desoneração concedida teria como efeito colateral garantir vantagem competitiva artificial, na medida em que a retirada de um custo permitiria o aumento do lucro ou a formação de preços menores, desequilibrando as relações de mercado. O relator consignou que seria o momento de revisão da jurisprudência da Corte, a fim de que fosse assentada a inaplicabilidade da imunidade tributária recíproca à propriedade imóvel desvinculada de finalidade estatal.

No tocante à questão de a recorrida não poder ser considerada sujeito passivo da exação, visto que incabível sua qualificação como "possuidora a qualquer título", o relator superou orientação consolidada pela 2ª Turma para concluir que a matéria poderia ser objeto de apreciação em recurso extraordinário e afastou, em conseqüência, a aplicação dos Verbetes 279 e 283 da Súmula do STF. Afirmou que a definição do sujeito passivo do IPTU dependeria de interpretação constitucional, pois seria com fundamento na competência tributária que o ente federado cobraria validamente o tributo. Destarte, salientou que o art. 34 do CTN ("Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título.") deveria ser lido à luz da Constituição, com ênfase em 3 pontos: materialidade possível do IPTU, isonomia e livres iniciativa e concorrência. Mencionou que a sujeição passiva também abarcaria a figura do responsável tributário, não podendo o tribunal de origem pura e simplesmente julgar ser a tributação inválida, porquanto direcionada a quem não seria proprietário. Assinalou a existência de termo de responsabilidade — em que firmada a responsabilidade do concessionário pelo pagamento de tributos municipais — a compor o conjunto fático-probatório, o que tornaria desnecessária a reabertura de instrução para se decidir esse caso. Em arremate, destacou que o locatário empresarial com fins lucrativos também seria possuidor a qualquer título, para fins de incidência do IPTU, nos termos constitucionais. Resgatou, no ponto, a essência da Súmula 456 desta Corte ("O Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recurso extraordinário, julgará a causa, aplicando o direito à espécie.") para adequar o julgado às linhas essenciais que dariam sentido tanto à imunidade tributária como à atribuição de sujeição passiva.

Em divergência, o Min. Dias Toffoli desproveu o recurso e manteve a orientação firmada no julgamento do RE 451152/RJ (DJU de 27.4.2007), segundo a qual o cerne da controvérsia não estaria em saber se haveria, ou não, imunidade recíproca quando o imóvel da União fosse destinado à exploração comercial, mas se a recorrida poderia, ou não, figurar no pólo passivo da obrigação tributária do IPTU. Na ocasião, entendera-se que a empresa não preencheria nenhum dos requisitos para ser contribuinte do imposto, pois detentora de posse precária e desdobrada, decorrente de contrato de concessão de uso. Após, pediu vista a Min. Cármen Lúcia. RE 434251/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 26.8.2010. (RE-434251) (Fonte: STF)

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